Qual é o papel da fibra alimentar enteral na sepse?

Qual é o papel da fibra alimentar enteral na sepse?

fibra sepse
Fonte: Canva.com

A sepse é definida como uma disfunção orgânica complexa, causada por uma resposta desregulada à infecção. Além de aumentar o risco de choque séptico e falência múltipla de órgãos, a sepse é a principal causa de morte na UTI. Nesse sentido, evidências crescentes mostram que a fibra alimentar, administrada a partir da nutrição enteral, poderia prevenir e tratar a sepse. 

Para investigar essa hipótese, uma nova revisão narrativa foi conduzida, explorando as evidências científicas disponíveis sobre o papel da fibra alimentar enteral na sepse. Continue lendo para descobrir os achados desta pesquisa.

Os papéis da fibra enteral na sepse

As fibras alimentares como parte da nutrição enteral poderiam trazer benefícios para a sepse a partir de vários mecanismos. Veja-os a seguir:

Modulação da microbiota intestinal

Na sepse, há um colapso súbito e drástico da microbiota comensal, com aumento de patobiontes e declínio na diversidade.  Por outro lado, sabe-se que a fermentação das fibras produz ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs), como acetato, propionato e butirato. Na microbiota, os AGCCs possuem efeito estimulante à populações microbianas protetoras.

Integridade da barreira intestinal 

Os AGCCs também promovem a homeostase e a integridade da barreira intestinal, através da redução da inflamação e do aumento da produção de muco intestinal. Esse efeito pode prevenir a sepse, pois evita a translocação de microrganismos e endotoxinas para a circulação sistêmica.

Resposta imune intestinal

Uma resposta imune desregulada à infecção é um fator-chave da sepse. Entretanto, a produção de AGCCs derivada do consumo de fibras serve como fonte de energia para células epiteliais que modulam o metabolismo e a função imunológica. Estas substâncias estimulam  produção de IgA e diferenciação das células Treg.

Prevenção da inflamação sistêmica

Em locais de infecção, os AGCCs modulam parâmetros pró e anti-inflamatórios, como IL-10, IFNγ e TNα. Como consequência, previne-se o desenvolvimento da inflamação sistêmica. Por exemplo, em estudos anteriores, a NE com fibras alimentares reduziu os níveis de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS) e proteína C reativa (PCR) em pacientes graves.

Fibra alimentar enteral na sepse: benefícios clínicos

A partir dos mecanismos descritos anteriormente, os autores sugeriram que a suplementação de fibra enteral poderia, de fato, prevenir o desenvolvimento da sepse. Estudos com bebês prematuros e pacientes adultos graves corroboram essa hipótese. 

Entretanto, a prevenção da sepse não é a única vantagem potencial das fibras enterais. Tal estratégia poderia beneficiar também os sintomas dessa condição, como é o caso da diarreia. Segundo as pesquisas incluídas na revisão, a NE com fibras diminui a incidência de diarreia, além de reduzir o número de fezes líquidas em comparação com a NE padrão.

Em contrapartida, os dados sobre a eficácia das fibras enterais na sepse em termos de infecção, mortalidade, e redução do tempo de internação são limitados. Todavia, os resultados dos estudos são promissores, e mostram uma tendência positiva.

Indicações e efeitos adversos

De modo geral, as diretrizes de nutrição não fornecem recomendações claras sobre o uso de fibra alimentar enteral em pacientes gravemente enfermos. A ASPEN e a SCCM, no entanto, recomendam suplementos de fibra solúvel fermentável em pacientes estáveis ​​de UTI, mas desaconselham o uso rotineiro de fibras mistas ou insolúveis.

Em relação aos efeitos adversos, há preocupações específicas em pacientes instáveis com risco de problemas intestinais, como isquemia intestinal ou dismotilidade grave. Nesta população, poderia ocorrer aumento da fermentação e distensão intestinal, resultando em um risco aumentado de desfechos negativos. Contudo, as evidências que respaldam essas preocupações são limitadas. 

Por fim, é crucial considerar a interação entre fibras alimentares e medicamentos, já que essa interação pode ter implicações para a saúde intestinal. Em pacientes que fazem uso de antibióticos por via oral, as fibras podem oferecer benefícios limitados, sendo fundamental monitorar possíveis efeitos colaterais, como dor abdominal ou gases.

Conclusão

Apesar do debate contínuo, a nutrição enteral contendo fibras alimentares mostra um grande potencial em prevenir a incidência de sepse, além de atenuar os desfechos relacionados à condição. Entretanto, os autores ressaltam que a produção científica sobre o tema ainda é escassa, e que mais pesquisas com ensaios clínicos grandes e de alta qualidade são necessárias.

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Referência:

Huwiler VV, Scalise M, Schönenberger KA, Mühlebach S, Stanga Z, Balmer ML. The Role of Dietary Fibre in Enteral Nutrition in Sepsis Prevention and Therapy: A Narrative Review. Nutrients. 2023 May 26;15(11):2489. doi: 10.3390/nu15112489. PMID: 37299452; PMCID: PMC10255575.

Pós-graduação de Nutrição Clínica

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