Crononutrição: como padrões alimentares crononutricionais interferem na saúde?

Crononutrição: como padrões alimentares crononutricionais interferem na saúde?

crononutrição
Fonte: Canva.com

Foi-se o tempo em que a alimentação saudável era definida pela mera ingestão adequada de nutrientes. Atualmente, já sabemos que muitos outros fatores alimentares afetam a saúde. Mais recentemente, a crononutrição vêm mostrando que os horários das refeições podem ser um parâmetro decisivo para a fisiologia do corpo humano.

Mas afinal, o que é a crononutrição, e como os padrões alimentares crono nutricionais afetam a nossa saúde? A seguir, descubra a resposta para essas perguntas, com base em um recente estudo científico.

O que é crononutrição?

A crononutrição é o estudo da ingestão de alimentos em coordenação ao ciclo circadiano do corpo, e a influência desse processo no surgimento de doenças metabólicas.

Além “do quê” se come, a crononutrição preocupa-se com o “quando” se come, ou seja, os momentos em que as refeições são feitas. 

Nesse sentido, a ciência sugere que o horário que nos alimentamos afeta diversos processo fisiológicos, incluindo:

  • Ciclo sono-vigília;
  • Temperatura corporal;
  • Metabolismo;
  • Pressão arterial;
  • Níveis hormonais.

Como sabemos, esses processos estão diretamente envolvidos no desenvolvimento da obesidade e outras morbidades. Por isso, identificar o melhor padrão crononutricional têm sido alvo de muitas pesquisas na área da saúde.

Novo estudo identifica 4 padrões alimentares crononutricionais 

Em uma recente pesquisa observacional, 173 pacientes adultos com obesidade severa foram recrutados. O objetivo era identificar padrões crononutricionais, com base na análise dos hábitos alimentares destes indivíduos. Além disso, os pesquisadores buscaram as relações entre estes perfis e a saúde física e mental dos participantes.

Para isso, os autores recolheram um extenso número de informações sobre cada paciente, incluindo:

  • Características demográficas: sexo, idade, educação, exercício, hábitos de álcool e tabagismo;
  • Dados clínicos: presença de hipertensão, diabetes e dislipidemia;
  • Medidas antropométricas: altura, peso e IMC;
  • Avaliação bioquímica: glicose, insulina, teste de tolerância à glicose e perfil lipídico;
  • Avaliação nutricional: aplicação de um recordatório de 24h (foco em obter os momentos das refeições, e não calorias/tipos de alimentos/macronutrientes/porções);
  • Dados psicométricos: aplicação de testes psicológicos (SF-36, SCL-90-R, EAT-26, BES, Y-FAS e BIS-11).

Em seguida, com auxílio de uma modelo estatístico refinado, os autores identificaram 4 perfis crononutricionais, descritos na tabela abaixo.

Perfil 1 – “comedores de refeições” 

(n=80)

Três refeições principais (café da manhã, almoço e jantar).

Poderiam fazer alguns lanches de manhã ou tarde, mas não a noite. 

Não beliscavam alimentos.

Perfil 2 – “comedores de refeições e lanches” 

(n=11)

Três refeições principais (café da manhã, almoço e jantar).

Faziam alguns lanches de manhã, tarde ou noite.

Não beliscavam alimentos.

Perfil 3 – “comedores contínuos dia e noite” 

(n=55)

Propensão constante a comer durante as 24 horas.

Muitos tipos diferentes de refeições, incluindo lanches e petiscos, principalmente durante o dia (mas também à noite).

Perfil 4 – “comedores contínuos durante o dia” (n=27) Muitos tipos diferentes de refeições, incluindo lanches e petiscos, apenas durante o dia (e não à noite).

Os autores ressaltam as diferenças entre os “lanches”, definidos como uma refeição pequena, leve e rápida, realizada entre as principais refeições; e os “petiscos/beliscos”, entendidos como o comer não planejado e constante entre as refeições.

Nota-se que grande parte dos participantes (47%) se enquadravam nos perfis 3 ou 4 de crononutrição, apontados como “dietas desestruturadas, caóticas e em nítido contraste com os padrões alimentares recomendados”. 

Lanches noturnos se associaram a menor saúde mental e física

Após a análise dos resultados, os pesquisadores descobriram que pacientes com perfis 3 e 4 apresentaram os piores desempenhos nas pontuações psicológicas, e também na saúde física.

Nesse sentido, o perfil 3 apresentou:

  • Maior nível de triglicerídeos (TG);
  • Menor qualidade de vida física e mental percebida;
  • Sintomas psicopatológicos mais intensos;
  • Mais sintomas e preocupações característicos de transtornos alimentares;
  • Impulsividade aumentada;
  • Mais compulsão alimentar;
  • Maior dependência alimentar.

O perfil 4 apresentou características similares, com exceção de TG, saúde mental percebida, e da impulsividade e dependência alimentar.

Em resumo, os participantes com perfil de crononutrição marcado pela prevalência de lanches e petiscos durante todo o dia, incluindo a noite, tiveram os piores sintomas de saúde mental e física.

Resultados controversos

Apesar dos achados anteriores confirmarem as pesquisas da área, alguns resultados deste estudo foram contraditórios com a literatura anterior. 

Por exemplo, os autores não encontraram nenhuma associação entre os perfis de crononutrição e o IMC, embora um maior IMC tenha influenciado negativamente a dislipidemia, o perfil lipídico, os níveis de HOMA e alguns teste psicológicos. 

Em estudos anteriores, indivíduos com cronotipo noturno tiveram maior propensão a estilos de vida não saudáveis e valores elevados de IMC.

Outros parâmetros como índice HOMA e risco de morbidades não se associaram aos perfis crononutricionais. Sugere-se que o pequeno tamanho da amostra, a heterogeneidade da coorte, e fatores nutricionais não medidos possam ter influenciado este resultado. 

Finalmente, o hábito de fumar foi menos frequente em participantes de perfil 3 a 4. Possivelmente, estes indivíduos podem estar usando a alimentação como um mecanismo de enfrentamento ao estresse ao invés de outros comportamentos, como o tabagismo. 

Conclusão

De modo geral, padrões alimentares caracterizados por lanches e petiscos durante dia e noite foram associados a piores resultados da saúde física e mental em pacientes com obesidade.

Entretanto, a pesquisa observacional estabelece apenas associações, e não uma relação de causalidade. Para encontrar os motivos dessas associações, mais estudos são necessários.

Apesar das limitações, o estudo aponta a importância em investigar o momento das refeições de cada paciente, de modo a orientar um tratamento nutricional que respeite o relógio biológico e traga melhores resultados em saúde. 

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Referência:

Bettini S, Schiff S, Carraro E, Callegari C, Gusella B, Pontesilli GM, D’Angelo M, Baldan V, Zattarin A, Romanelli G, et al. Chrono-Nutritional Patterns, Medical Comorbidities, and Psychological Status in Patients with Severe Obesity. Nutrients. 2023; 15(23):5003. https://doi.org/10.3390/nu15235003

Pós-graduação de Nutrição Clínica

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