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Manter a massa, a qualidade e a força muscular é uma batalha constante para pacientes oncológicos. Sendo assim, a suplementação proteica durante o tratamento de câncer poderia ser um componente importante neste desafio.
Um novo artigo científico publicado no The American Journal of Clinical Nutrition buscou revisar, de forma geral, quais são os benefícios clínicos desta estratégia, se ela é segura, e possíveis lacunas científicas. Confira a seguir.
Impactos do câncer no estado nutricional
A sarcopenia e a baixa atenuação muscular estão entre os principais preditores de desfechos desfavoráveis na oncologia. A perda de massa muscular compromete a função física, reduz a qualidade de vida, diminui a sobrevida, reduz a tolerância à quimioterapia e eleva o risco de complicações cirúrgicas.
Nesse sentido, as próprias terapias oncológicas podem contribuir para a perda muscular. São exemplos:
- Quimioterapia: provoca náuseas, vômitos, diarreia, xerostomia e disgeusia, reduzindo a ingestão alimentar.
- Radioterapia: pode induzir anorexia, fadiga, mucosite, xerostomia, disfagia e enterite por radiação, impedindo a capacidade do paciente de consumir e absorver nutrientes suficientes.
- Cirurgia oncológica: seus efeitos fisiológicos contribuem para a deterioração nutricional dos pacientes, por meio de efeitos combinados da ingestão oral reduzida, má absorção e perdas de nutrientes.
Ainda, as alterações metabólicas associadas ao câncer, predominantemente um estado pró-inflamatório, aceleram o catabolismo muscular e reduzem a síntese de proteína muscular.
Esse equilíbrio alterado de ingestão oral reduzida e/ou absorção, juntamente com o aumento do catabolismo, aumenta as necessidades de proteína de pacientes com câncer.
Proteína em câncer: o que dizem as diretrizes?
As Diretrizes da Sociedade Europeia de Nutrição Clínica e Metabolismo (ESPEN) sobre nutrição em pacientes com câncer recomendam que a ingestão de proteína em adultos exceda 1 g/kg/d e idealmente atinja 1,5 g/kg/d.
Essas diretrizes caracterizam o nível de evidência para apoiar esta recomendação como “moderado” em qualidade e pedem que pesquisas futuras se concentrem em examinar o efeito de um maior suprimento de proteína (1 a 2 g/kg/d) e da composição de proteína/aminoácidos nos resultados clínicos.
Suplementação proteica em câncer: o que dizem as evidências científicas?
Benefícios clínicos e segurança
Uma revisão sistemática e meta-análise de 34 estudos exclusivos investigou a evidência de suplementação rica em proteínas em vários resultados clínicos e relatados por pacientes durante a terapia do câncer.
As descobertas gerais desta revisão apoiam a segurança da suplementação rica em proteínas. Além disso, os autores descobriram que seu uso pode levar a resultados benéficos para pacientes em tratamento oncológico, incluindo
- Mitigação do declínio do peso corporal
- Melhora da força de preensão manual
- Menores taxas de hospitalização
Embora a revisão não tenha encontrado benefícios diretos da suplementação rica em proteínas na qualidade de vida relacionada à saúde de pacientes com câncer, nenhum efeito adverso sério foi relatado.
Efeitos sobre a perda de peso e massa muscular
A perda de peso antes do tratamento do câncer é um fenômeno comum e está associada a resultados piores. Mesmo uma perda de peso modesta de 2.4% pode impactar negativamente a sobrevivência, independentemente do local do câncer, estágio ou status de desempenho.
Uma meta-análise de subgrupo revelou que a suplementação rica em proteínas teve um efeito positivo no peso corporal de pacientes com perda de peso anterior.
Além disso, esta revisão sistemática descobriu que 85% dos estudos incluídos mostraram que a suplementação rica em proteínas teve um impacto benéfico na massa muscular quando comparada aos controles.
Em relação à massa muscular, suplementos contendo aminoácidos de cadeia ramificada e aqueles enriquecidos com hidroximetilbutirato e ômega-3 apresentaram efeito benéfico.
Entretanto, em 60% dos estudos, foi observado que o aumento da inflamação sistêmica durante o tratamento pode inibir os ganhos de massa muscular.
Dose de proteína ideal
Na literatura científica, os efeitos benéficos da suplementação proteica durante o tratamento de câncer geralmente ocorrem em doses de 10 a 14,9 g de proteína/porção ou ≥15 g de proteína/porção, ou fornecendo uma ingestão diária total de ≥40 g.
Embora a dose ideal de proteína necessária para estimular a síntese de proteína muscular justifique uma investigação mais aprofundada, os autores estimam que as necessidades de pacientes com câncer são provavelmente maiores do que a recomendação de 1 g/kg/d.
Limitações e perspectivas futuras
Dado o alto risco de viés observado nos estudos incluídos, os autores reconhecem que suas conclusões devem ser interpretadas com cautela.
Eles reconhecem a importância de desenvolver as descobertas desta revisão com ensaios clínicos de nutrição mais robustos que incluam descrições metodológicas claras das técnicas de avaliação empregadas.
Conclusão
Em resumo, a suplementação rica em proteínas parece ser segura e com efeitos clínicos significativos. Os estudos atuais ajudam a aliviar as preocupações entre alguns profissionais e pacientes sobre o equívoco de que “a nutrição alimenta o tumor”.
Nesse sentido, a triagem nutricional precoce é fundamental para identificar alterações na composição corporal e garantir intervenções oportunas.
As evidências reforçam a importância de integrar a suplementação proteica no tratamento oncológico, especialmente para pacientes em risco de perda de peso, promovendo melhores resultados e uma recuperação mais eficiente.
Para ler o artigo científico completo, clique aqui.
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Referência:
Chonaill, D. N., & Ryan, A. M. (2024). High-protein supplementation during cancer therapy–strengthening of the evidence-base to support its safety and clinical benefits. The American Journal of Clinical Nutrition, 120(6), 1307-1308.