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O câncer de mama é a neoplasia mais prevalente e uma das principais causas globais de mortalidade por câncer em mulheres. Ele é caracterizada como uma doença heterogênea, e sua classificação molecular é essencial para guiar o tratamento e prever o prognóstico.
Entre os subtipos mais agressivos, estão o câncer de mama triplo-negativo (CMTN), que representa 10% a 15% dos casos, e o subtipo receptor do fator de crescimento epidérmico humano 2 positivo (HER2+++), responsável por 15% a 20% dos diagnósticos.
Além da adição de imunoterapia, atualmente não há outra terapia direcionada para o CMTN
Para muitos pacientes, a quimioterapia neoadjuvante (NAC), administrada antes da cirurgia, é a principal recomendação. O objetivo é reduzir o risco de recorrência à longo prazo, diminuir o estadiamento do tumor e informar a terapia adjuvante subsequente avaliando a resposta ao tratamento.
A avaliação da resposta à NAC é frequentemente feita por meio da resposta patológica completa (pCR) ou pela medição do marcador de proliferação celular Ki-67, um fator prognóstico independente para a resposta à quimioterapia.
O potencial do DHA no combate ao câncer
O ácido docosahexaenoico (DHA), um ácido graxo poli-insaturado de cadeia longa da série ômega-3, tem sido extensivamente estudado por seus efeitos antitumorais em modelos in vitro e animais.
Estudos pré-clínicos demonstraram que o DHA pode atuar em sinergia com quimioterápicos, como o docetaxel, resultando na redução do tamanho do tumor, diminuição da expressão de Ki-67 e aumentos nos marcadores de apoptose e necroptose nos tumores excisados.
Os mecanismos de ação propostos incluem a incorporação do DHA nos microdomínios das membranas celulares tumorais, alterando a fluidez da membrana e a atividade dos receptores. Essa mudança pode levar à morte celular, interrupção do ciclo celular e diminuição da proliferação.
Além disso, há evidências clínicas sugerindo que a suplementação de ômega-3 pode reduzir alguns efeitos colaterais da quimioterapia, como a neuropatia periférica induzida por paclitaxel.
Contudo, a evidência clínica sobre a eficácia da suplementação de DHA isoladamente em pacientes com câncer de mama, especialmente no cenário neoadjuvante, ainda é limitada. Estudos anteriores se concentraram principalmente na combinação de DHA com EPA (ácido eicosapentaenoico), e apenas um pequeno ensaio clínico aberto sugeriu que a suplementação de DHA poderia melhorar a sobrevida global no câncer de mama metastático.
O ensaio clínico DHA-WIN
O estudo DHA-WIN (Docosahexaenoic acid for Women with Breast Cancer in the Neoadjuvant Setting) foi um ensaio clínico de fase II, randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, realizado para investigar a segurança e a eficácia da suplementação de DHA durante a quimioterapia neoadjuvante.
No total, 49 pacientes completaram o ensaio. As participantes foram randomizadas para receber 4,4 g/dia de DHA na forma de triacilglicerol de algas ou placebo (óleo de milho/soja), por via oral, ao longo de seis ciclos (18 semanas) de quimioterapia neoadjuvante.
O desfecho primário do estudo foi a avaliação das alterações na porcentagem de expressão do marcador de proliferação Ki-67 da biópsia pré-tratamento para a excisão cirúrgica pós-tratamento. Desfechos secundários incluíram a taxa de pCR, segurança e sobrevida em em longo prazo.
Segurança comprovada, efeito adicional limitado
Os resultados do ensaio DHA-WIN apresentaram os seguintes achados:
– Boa segurança e tolerabilidade: a suplementação de 4,4 g/dia de DHA foi considerada segura e bem tolerada. A adesão média geral foi alta (81,6%), e o perfil de ácidos graxos confirmou uma incorporação de DHA duas vezes maior nos eritrócitos e fosfolipídios plasmáticos do grupo DHA. Além disso, nenhum evento adverso foi diretamente atribuído ao suplemento.
– Eficácia geral (Ki-67 e pCR): a quimioterapia neoadjuvante levou, como esperado, a uma redução significativa na expressão de Ki-67 em ambos os grupos. No entanto, não foram observados efeitos benéficos adicionais significativos com a suplementação de DHA na redução geral do Ki-67 ou na taxa de resposta patológica completa (pCR).
– Análise de subgrupo (HER2+++): a análise por subtipo de câncer revelou uma tendência promissora. Observou-se uma maior redução na expressão de Ki-67 no subgrupo HER2+++ que recebeu DHA, em comparação com o placebo.
Em resumo, a NAC por si só foi eficaz na redução da proliferação celular, mas a adição da dose elevada de DHA não forneceu um benefício adicional significativo no desfecho primário geral.
Os autores concluíram que o DHA é seguro e bem tolerado, mas não demonstrou efeitos benéficos adicionais à quimioterapia neoadjuvante.
Conclusão
Em suma, os achados do DHA-WIN reforçaram a importância da segurança na suplementação nutricional durante o tratamento oncológico. Embora a eficácia não tenha sido comprovada no grupo geral, a tendência de maior redução do Ki-67 no subgrupo HER2+++ é clinicamente relevante.
Essa tendência sugere que o DHA pode atuar de forma mais sinérgica em tumores com características moleculares específicas, como a superexpressão do HER2.
Dessa forma, pesquisas futuras são necessárias para confirmar se a suplementação de DHA pode ser uma estratégia terapêutica adjuvante eficaz, especialmente direcionada para o subtipo HER2+++.
Para ler o artigo científico completo, clique aqui.
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Referência:
Munhoz J, Newell M, Bigras G, et al. Safety and efficacy of docosahexaenoic acid supplementation during neoadjuvant breast cancer therapy: Findings from the phase II, double-blind, randomized controlled DHA-WIN trial. Int J Cancer. 2025;157:1405–1419. doi:10.1002/ijc.35517.