Pacientes com pancreatite aguda grave apresentam alterações metabólicas oriundas da liberação de enzimas digestivas e de citocinas, que podem resultar em hipermetabolismo, balanço nitrogenado negativo e falência de diferentes órgãos. É comum que pacientes com pancreatite aguda grave apresentem desnutrição e, por isso, a introdução precoce de nutrição enteral pode ser recomendada para prevenir a piora de desfechos clínicos.
Apesar da importância desta recomendação, a nutrição enteral pode contribuir para um conjunto de alterações que impactam a condição de base da pancreatite aguda grave, modificando a motilidade intestinal e a tolerância alimentar. Distensão abdominal, diarreia, constipação, ruídos intestinais intensos e até sangramento são sinais comuns de manifestação de intolerância alimentar e, ao considerar possibilidades de intervenção, fibras solúveis surgem como alternativas promissoras.
Há evidências de que o consumo de fibras solúveis pode modular a motilidade intestinal e, ao considerar que existem poucos dados sobre o benefício de fibras solúveis na pancreatite aguda grave, um estudo prospectivo, randomizado, controlado e centralizado foi desenvolvido com pacientes internados em unidade de terapia intensiva (UTI). Critérios de inclusão consideravam ausência de terapia nutricional antes da admissão hospitalar. Pacientes que se recusaram a utilizar sonda nasogástrica, que foram submetidos a cirurgia abdominal aberta, portadores de pancreatite decorrente de trauma, gravidez ou condição autoimune ou que apresentassem outras doenças gastrintestinais, foram excluídos.
Os participantes foram divididos em grupo controle (22 pacientes) e grupo intervenção (24 pacientes). Durante o período do estudo, o grupo intervenção recebeu 20g de polidextrose por dia e, ao analisar a incidência de complicações e mortalidade, não foram observadas diferenças significativas entre os grupos. Contudo, o grupo que recebeu a fibra apresentou redução do tempo para alcance de necessidades energéticas diárias, melhora da tolerância alimentar, menor distensão abdominal e redução de episódios de diarreia e constipação. A permanência na UTI também foi menor no grupo que recebeu fibra: média de 10 dias versus 13 dias no grupo controle. Outros parâmetros como de diamina oxidase, ácido láctico, endotoxina e peptídeo intestinal vasoativo apresentaram níveis sanguíneos significativamente reduzidos nos pacientes tratados com fibra. Isto pode representar melhora na permeabilidade intestinal e distúrbios da motilidade, reduzindo a incidência de intolerância alimentar associada à nutrição enteral em pacientes com pancreatite aguda grave.
Referência
Chen T, Ma Y, Xu L, Sun C, Xu H, Zhu J. Soluble Dietary Fiber Reduces Feeding Intolerance in Severe Acute Pancreatitis: A Randomized Study. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2021 Jan;45(1):125-135. doi: 10.1002/jpen.1816. Epub 2020 Mar 5. PMID: 32141126.