Fraqueza adquirida na UTI: efeitos da mobilização e nutrição precoce

Fraqueza adquirida na UTI: efeitos da mobilização e nutrição precoce

fraqueza adquirida na UTI
Fonte: Canva

A fraqueza adquirida na UTI (FAUTI) é uma condição comum e complexa em pacientes internados nas unidades de terapia intensiva, mesmo em estadias curtas. Caracterizada por fraqueza muscular grave, a FAUTI pode levar à incapacidade a longo prazo nos sobreviventes.

Historicamente, a literatura científica tem se concentrado no aspecto nutricional, resultando em diretrizes que recomendam o início da nutrição precoce, com o objetivo de atingir as metas calóricas e proteicas nos primeiros cinco dias de admissão na UTI. 

No entanto, estudos recentes mostram que a nutrição, por si só, pode não ser suficiente para combater a perda muscular, que está frequentemente ligada à imobilidade prolongada dos pacientes.

Uma revisão científica recente buscou resumir o conhecimento atual sobre este tema, enfatizando a importância de uma abordagem integrada que combine nutrição e mobilização precoce. Veja os principais achados dos pesquisadores.

Avaliação do estado nutricional e físico na UTI

A avaliação precisa da quantidade e qualidade muscular é um desafio na UTI. Medidas tradicionais como o IMC e biomarcadores séricos (albumina, transtirretina) podem ser imprecisas devido às alterações de fluidos e inflamação em pacientes críticos.

Para superar essas limitações, novas ferramentas de triagem nutricional, como o MUST, NRS-2002 e o escore NUTRIC, são utilizadas para identificar precocemente pacientes em risco de desnutrição

O escore SCREENIC, desenvolvido especificamente para pacientes de UTI, demonstrou boa precisão na previsão de estadias prolongadas na UTI e no hospital.

Quanto à FAUTI, a falta de um consenso uniforme nos critérios diagnósticos é um desafio. O ultrassom muscular tem surgido como uma ferramenta valiosa e não invasiva para avaliar a massa e a qualidade muscular em tempo real. Além disso, a escala do Medical Research Council (MRC) é amplamente utilizada para avaliar o desempenho motor.

Benefícios da mobilização precoce na UTI

A mobilização precoce na UTI, que inclui movimentos passivos, exercícios ativos, sentar ou levantar, deve ser iniciada assim que clinicamente seguro para o paciente.

Abaixo, confira os principais pontos a serem considerados quanto à mobilização precoce na UTI.

Preservação da massa e função muscular

Pacientes críticos podem perder até 20% da massa muscular na primeira semana de imobilidade. 

A mobilização precoce age como uma estratégia protetora, mantendo a integridade neuromuscular mesmo com movimentos mínimos. 

Os exercícios também melhoram a resposta muscular a aminoácidos exógenos, otimizando a síntese proteica.

Melhora dos resultados funcionais

Pacientes que participam de mobilização precoce demonstram melhor recuperação funcional, incluindo maior mobilidade pós-alta e auto-suficiência

A mobilização precoce também reduz complicações associadas à imobilidade prolongada, como trombose venosa profunda, infecções pulmonares e úlceras por pressão. 

Resultados a longo prazo e pós-alta

A mobilização precoce está associada à melhora da função física em sobreviventes em 6 meses e pode reduzir o comprometimento cognitivo a longo prazo.

Ademais, estudos sugerem que níveis mais altos de mobilidade nos primeiros três dias de UTI estão associados a um menor risco de morte em 90 dias.

Desafios na implementação

Apesar dos benefícios, a mobilização precoce enfrenta desafios como a necessidade de estabilidade clínica do paciente, a exigência de equipe e treinamento suficientes, e incertezas sobre o momento, a modalidade e a dosagem ideais das intervenções. 

No entanto, estratégias como a mobilização passiva e o uso de realidade virtual têm sido exploradas para superar essas barreiras.

Benefícios da nutrição precoce na UTI

A nutrição precoce, idealmente dentro de 24 a 48 horas da admissão na UTI, é recomendada. 

Embora as diretrizes sugiram iniciar a nutrição nas primeiras 48 horas e atingir as metas em 5 dias, o momento ideal ainda é debatido.

Um estudo com 100 pacientes de UTI mostrou que aqueles que iniciaram a nutrição enteral na admissão apresentaram:

  • Níveis mais altos de albumina e pré-albumina séricas
  • Menor tempo de internação na UTI e ventilação
  • Menos complicações
  • Redução da mortalidade

A nutrição enteral demonstrou melhorar o balanço proteico corporal total, crucial para otimizar o metabolismo proteico em pacientes de UTI. 

Além disso, a NE precoce pode regular as vias imunológicas, reduzir a formação de armadilhas extracelulares de neutrófilos (NETs) e diminuir o risco de infecção.

Riscos potenciais

O fornecimento precoce de nutrição pode apresentar riscos como hiperglicemia, estresse hepático e síndrome de realimentação, que pode causar desequilíbrios eletrolíticos perigosos. 

Questões digestivas como esvaziamento gástrico tardio ou diarreia também podem afetar a tolerância. 

Apesar das controvérsias, há um consenso de que as intervenções nutricionais devem ser personalizadas.

Mobilização + nutrição precoce: efeitos combinados na UTI

Estudos recentes têm reforçado que a combinação de mobilização precoce com suporte nutricional adequado é uma estratégia mais eficaz para mitigar a fraqueza adquirida na UTI. 

Um ensaio clínico randomizado duplo-cego demonstrou que a mobilização precoce combinada com nutrição baseada em diretrizes reduziu significativamente a incidência de FAUTI e melhorou a força muscular em comparação com o tratamento padrão.

Essa abordagem integrada otimiza o metabolismo proteico, preserva a massa muscular e melhora os resultados funcionais e cognitivos a longo prazo, contribuindo para uma recuperação mais completa e uma melhor qualidade de vida para os sobreviventes de doenças críticas.

O que podemos concluir?

A fraqueza adquirida na UTI é uma complicação séria em pacientes críticos, com impactos duradouros na recuperação. Uma abordagem combinada de mobilização precoce e suporte nutricional adequado é crucial para prevenir e tratar a FAUTI, promovendo uma recuperação mais robusta e melhor qualidade de vida.

Para ler o artigo científico completo, clique aqui.

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Referência:

Formenti P, Menozzi A, Sabbatini G, Gotti M, Galimberti A, Bruno G, Pezzi A, Umbrello M. Combined Effects of Early Mobilization and Nutrition on ICU-Acquired Weakness. Nutrients. 2025 Mar 19;17(6):1073. doi: 10.3390/nu17061073. PMID: 40292494; PMCID: PMC11945635.

Pós-graduação de Nutrição Clínica

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